O ministro do Interior uruguaio, Luis Alberto Heber, se reunirá na próxima semana com o novo embaixador brasileiro, Marcos Leal Raposo. O objetivo do encontro será aprofundar várias linhas de ação de cooperação entre os dois países em termos de segurança na área fronteiriça. Isso foi confirmado ao El Observador por fontes oficiais, lembrando que no encontro o ministro apresentará ao representante diplomático sua especial preocupação com a presença de presos muito perigosos em prisões brasileiras próximas à fronteira com o Uruguai.
Em especial, certos líderes de poderosas quadrilhas ligadas ao narcotráfico e ao crime organizado, no estilo do Primeiro Comando da Capital (PCC). A preocupação das autoridades se dá pela incidência desses internos em atividades criminosas na fronteira, com repercussões diretas do lado uruguaio. Nesse sentido, as fontes indicaram que uma das opções será levantar a possibilidade de o Brasil transferir esses presos e afastá-los da área.
Esta é uma situação que vem preocupando as autoridades uruguaias há algum tempo. Em outubro do ano passado, Heber havia manifestado publicamente sua preocupação com a violência nas cidades uruguaias localizadas na fronteira com o Brasil. Especificamente, ele havia afirmado que Rivera era uma das portas de entrada para as quadrilhas brasileiras que optaram por atuar no Uruguai.
Em agosto de 2021, o Ministério do Interior informou sobre a “Operação Manabi”, que possibilitou a prisão em Rivera de dois integrantes de Os Tauras, outra das mais perigosas quadrilhas criminosas brasileiras, que pretendiam se estabelecer na fronteira e tomar espaço dos rivais Os Manos, no negócio de distribuição de medicamentos na região.
Uma nota do El Observador informava em abril deste ano que a disputa entre as duas gangues vinha assolando a cidade de Rivera. Dos oito homicídios registrados ali entre janeiro e março de 2021, seis estavam ligados ao tráfico de drogas. Um operador jurídico que controla as provas apresentadas nos casos disse que, quando analisadas as informações dos telefones confiscados, os líderes dessas quadrilhas falam de Rivera como uma “fronteira terrestre fácil”. “Aqui em Rivera todo mundo anda na rua com uma arma, como quem anda com o celular no bolso”, disse outro operador judicial.
As facções que tanto disputam o mercado de drogas recrutam pessoas para trabalhar junto com elas e o fato de “mudar de lado” muitas vezes provoca confrontos que terminam com a morte de alguns dos envolvidos. Eles também enfrentam consumidores viciados que não pagam. Eles vão de um lado a outro da fronteira, por isso a coordenação com a polícia brasileira é fundamental. O chefe de polícia de Rivera, Wilfredo Rodríguez, disse ao El Observador que a coordenação com seus colegas brasileiros é “excelente” e ocorre em todos os níveis das forças: federal, rodoviário, militar etc. Os narcotraficantes “vivem mudando a estratégia” e os obrigam a mudá-la, disse. Embora tenha alertado que essas organizações criminosas “vem de menos para mais”
A situação na fronteira tem repercussões a nível internacional. O portal especializado Insightcrime dedicou uma edição especial ao assunto nos últimos meses, destacando que a guerra de gangues no Rio Grande do Sul “desencadeou uma crise de segurança” do lado uruguaio. Lá, é feita referência a vários episódios registrados na área nos últimos tempos. Por exemplo, um tiroteio no coração da cidade de Rivera, derivado do confronto entre Os Manos e Os Tauras. O episódio, neste caso, resultou em dois ferimentos a bala. O pano de fundo do duro confronto entre os dois grupos é o controle do tráfico de drogas na fronteira.
De acordo com a análise, os confrontos se intensificaram a partir de 2018. Os Manos, presumivelmente, recebe seu suprimento de armas do PCC e aplica uma estratégia de emboscadas seletivas para repelir seu rival. A reportagem também indica que o confronto e, sobretudo, a expansão de Os Manos em território brasileiro preocupa as autoridades estaduais e federais brasileiras. Inclusive aponta sua presença no Porto de Montevidéu. A presença dessas faixas na fronteira é explicada pela condição tradicional da área como foco de comércio transfronteiriço com pouca regulamentação.
O ministro Heber, por sua vez, esteve em Santa Catarina nas últimas horas, com o objetivo específico de conhecer em primeira mão o modelo de segurança aplicado por aquele estado, e que é considerado modelo no Brasil.
Argimon e Mourão
A cooperação em segurança entre Uruguai e Brasil também foi um dos temas centrais do encontro entre a vice-presidente Beatriz Argimón e o vice-presidente daquele país, Hamilton Mourão, em visita oficial a Montevidéu. É um “capítulo especial” na relação, declarou o vice-presidente em conferência de imprensa. Em particular, o tráfico de drogas.
Segundo Argimón, após o encontro ficou clara a “vontade de fortalecer” uma série de linhas de ação conjunta.
Lá, ele avançou com um pedido do ministro da Defesa, Javier García, ao seu homólogo brasileiro Paulo Sergio Nogueira de Oliveira. O Uruguai levantou com o Brasil a possibilidade de ter aeronaves fabricadas no Brasil projetadas especificamente para o combate ao narcotráfico.
Fonte: El Observador