Entregue a autoridades dos governos brasileiro e uruguaio nesta quarta-feira (13), o estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental da Hidrovia da Lagoa Mirim, que ligará comercialmente o sul do Estado ao nordeste do país vizinho por via fluvial, prevê uma concessão de 30 anos (25 anos com possibilidade de renovação por mais cinco) à iniciativa privada e a possibilidade de transportar uma carga anual de cerca de 5 milhões de toneladas entre as duas fronteiras. O projeto, primeiro voltado ao transporte hidroviário qualificado no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) federal, é visto como fundamental para impulsionar o desenvolvimento econômico regional, reduzir custos logísticos e fortalecer as relações binacionais.
O levantamento, produzido ao longo de sete meses pela empresa paulista DTA Engenharia, servirá de referência para a elaboração do edital da obra, que consta entre as prioridades dessa reta final da atual gestão do presidente Jair Bolsonaro. O documento, com cerca de 500 páginas e elaborado por uma equipe de cerca de 30 técnicos, foi entregue ao ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, pelo presidente da DTA, engenheiro João Acácio Gomes de Oliveira, em solenidade na sede da embaixada do Uruguai em Brasília.
O estudo sugere duas modalidades de concessão a serem consideradas: a simples, onde todo o projeto fica a cargo da empresa concessionária, que deverá cobrar tarifas mais altas de pedágio e assumir todos os riscos do processo; e a patrocinada, na qual a União pode patrocinar o concessionário, que, em contrapartida, deve arcar com a manutenção e operação de todo o processo, cobrando tarifa reduzida.
A hidrovia terá 30 metros de largura, 3,80 metros de profundidade e 254 quilômetros de extensão. A obra em si não é considerada de alta complexidade e tem custo avaliado em 10 milhões de dólares, em torno de R$ 45 milhões. No entanto, o desafio do projeto está no equilíbrio de três tripés fundamentais: dragagem, sinalização da hidrovia e operacionalização da Eclusa de São Gonçalo, localizada em Pelotas; a regulação do transporte de cargas de navegação e a construção de terminais de apoio às operações.
“Não se faz uma hidrovia e se espera a carga, ela tem que ser feita tendo a carga disponível e terminais para operacionalização. As cargas se desenvolvem de acordo com as safras, e um terminal leva entre um ano e meio e dois anos para ser construído, então, o desafio do projeto é achar o equilíbrio dessas etapas”, avalia Oliveira.
Segundo o engenheiro, as despesas de capital (Capex), que incluem máquinas, equipamentos, instalações e benfeitorias à obra estão avaliadas em R$ 85 milhões, e as de operação (Opex), que envolvem custos com manutenção, salários, contratação de serviços, despesas de instalações, etc., estão orçadas em R$ 16 milhões anuais. A tarifa mais alta do pedágio ficaria em torno de R$ 10,00 por tonelada (embarcação mais carga), e a mais barata em torno de R$ 6,00 por tonelada, em caso de Capex do governo. O retorno do investimento (Payback) está previsto para um prazo estimado de 14 anos.
Incluído no programa de desestatização do governo federal em novembro do ano passado, o projeto da Hidrovia da Lagoa Mirim é considerado piloto para investimentos no modal hidroviário no País e será o primeiro pedagiado, ligando as fronteiras dos dois países. Seu funcionamento permitirá o escoamento de embarcações oriundas do Uruguai ao Porto de Rio Grande pela hidrovia, que conectará as Lagoas Mirim e dos Patos. O ponto de partida da obra será a dragagem e sinalização da hidrovia pelo Canal de São Gonçalo, que conecta as duas lagoas, no trecho entre o Canal do Sangradouro (Extremo Norte) e o Canal de Acesso ao Porto de Santa Vitória do Palmar (Extremo Sul).
Na solenidade, o ministro da Infraestrutura destacou que o projeto deve garantir tráfego seguro de embarcações e o escoamento de cargas pela região sul do continente sul-americano. “O Brasil e o Uruguai têm uma história grande. São mais do que países irmãos. Nós compartilhamos mais de mil quilômetros de fronteira e mantemos um expressivo comércio bilateral na ordem de US$ 3 bilhões por ano. Somos unidos por laços históricos, econômicos e culturais. O que queremos é ver essa hidrovia operando e a região fronteiriça, sobretudo no sudeste gaúcho e no nordeste do Uruguai, prosperando”, disse Sampaio, ao lado do embaixador uruguaio Guilherme Valles, um dos grandes articuladores para a implantação da hidrovia.
Presidente da DTA Engenharia, João Acácio Oliveira (e) entregou o estudo ao ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio (d). Crédito: Ricardo Botelho/MInfra/Divulgação/JC
Os próximos passos do projeto, segundo o ministro, dependem da revisão detalhada do estudo pelos órgãos competentes e, se necessário, uma complementação desse trabalho com apoio da CAF (Banco de Desenvolvimento da América Latina). Finalizado esse pente fino no projeto, será aberta uma consulta pública para contribuições de empresas, sociedade e interessados e, em seguida, todo o material parte para análise econômica do Tribunal de Contas da União (TCU).
Se aprovado o estudo de viabilidade, o projeto segue para lançamento do edital de concessão, a cargo da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), e marcação do leilão para recebimento das propostas interessadas. Apesar desse longo percurso do projeto, a previsão do governo federal é de conseguir lançar a licitação ainda este ano.